Não sei dizer exatamente há quantos anos conheço Lenice Bismarcker. Talvez 30, porque esse é o tempo que milito no jornalismo e nossos primeiros contatos remetem a essa época distante, em que sua mãe era viva e as duas mantinham uma loja de acessórios no bairro da Serra.
Não sei também quantas vezes entrevistei dona Hilda Magon, intrépida nos saltos altos, com aquele coque de tranças que realçava os traços fortes e maneiras delicadas. Uma lady a quem todas as mães confiavam as filhas, porque ela gostava de festas e abrigava as moças debaixo de asas protetoras.
Mas com Lenice, a amizade de verdade, o querer bem, a troca de afeto, telefonemas e confidências começaram três anos atrás, quando deixei o jornal Estado de Minas e o Marcelo Rios me convidou para escrever sobre moda em sua revista. E ela, que adorava Marcelinho, me ligou para dizer que estava muito feliz por ele me ter ao seu lado.
Aquele telefonema inesperado e generoso, numa manhã distante, me emprestando mil qualidades e competências em uma época em que um incerto futuro profissional se delineava à minha frente, me comoveu e nos estreitou para sempre.
Abri meu coração para Lenice, que, por sua vez, me introduziu no seu mundo cheio de amigos, flores e chapéus.
E ela não se cansava de dizer que, felizmente, a imagem da jornalista compenetrada e arredia, que tinha de mim, se desvaneceu para dar lugar a uma pessoa afetiva e carinhosa, que a abraçava demorado e com força.
Ficamos amigas.
Me comovia sentir como ela se afligia quando o mercado de festas ficava ruim, as noivas e madrinhas rareando no ateliê e o aluguel dos acessórios despencando. Mas era com animação que comemorava a retomada dos bons negócios. Guerreira, estava sempre pensando em uma estratégia para vender seus produtos.
Me encantava a vivacidade de Lenice, dando notícia de tudo que acontecia na cidade, ligada nos jornais, lutando para acompanhar os avanços tecnológicos, a internet, o facebook...
Me deliciava ver como ela, jovialmente, conseguia arrebanhar um bando de gente jovem ao redor atraindo atenção e carinho.
E, particularmente, respeitava a sua cruzada em prol dos chapéus, bandeira de uma vida.
Hoje pela manhã, ao saber que ela se foi, docemente, as recordações tomaram conta de mim.
Fiquei lembrando dos seus telefonemas, iniciados sempre com a promessa de não tomar muito do meu tempo, mas serenada pela minha disponibilidade em atendê-la, pronta para buscar a informação que ela desejava, a oferecer ajuda no que precisasse.
Fiquei pensando na franqueza ingênua de Lenice, na sua lucidez, no quanto ela amava a vida e no tanto que vibrava com as conquistas das pessoas de quem gostava...
Me lembrei do sucesso que fez na noite de autógrafos do último livro da Costanza Pascolato, que promovi, na loja da Mabel Magalhães - estava linda! Em outra noite, me prestigiando novamente, levou uma flor para enfeitar minha roupa, pura delicadeza!
Seus lindos e elegantes vestidos, o eterno chapéu, sua figura mignon, já meio encurvada, passearam pelos meus olhos durante todo o dia de hoje...Ai, que saudade!